
A vida de Maria Elena mudou quando o irmão Jorge Mario Bergoglio apareceu, com as vestes brancas de Papa e os mesmos sapatos pretos e cruz de prata que sempre usou como cardeal, na varanda da Basílica de S. Pedro em março de 2013. “Era para mim o meu irmão mais velho, aquele que jogava futebol, que ia à Ação Católica e que estudava. Realmente não me lembro de alguma vez ter deixado o nosso pai ou mãe zangados”, diria na primeira entrevista que concedeu após a sua eleição. Aos 77 anos, continua a viver na terra que viu crescer Francisco, Buenos Aires, e é a única de cinco irmãos ainda viva.
Depois da eleição do irmão mais velho, o telefone de Maria Elena não parou de tocar, confidenciou nessa entrevista de 2013 ao jornal italiano La Reppublica. Apesar de falar com ele com regularidade, não voltou a vê-lo, como chegou a temer antes do conclave de 2005, o primeiro em que Bergoglio participou e que escolheu Bento XVI para liderar a Igreja Católica. “Eu não queria que o meu irmão partisse. É uma posição um pouco egoísta”, reconheceu à CNN Espanha. Da segunda vez sentia-se mais preparada: “Rezei para que o Espírito Santo interviesse e não me ouvisse. E não ouviu … fez o que quis.”
Para os católicos, quis o Espírito Santo, por meio dos 114 cardeais em conclave, que Bergoglio fosse o escolhido. Se enquanto Papa Francisco manteve a mesma postura de humildade pela qual era conhecido, foi também desse modo e com discrição que a sua família seguiu a sua vida. Pouco se sabe sobre os seus familiares, espalhados não só pela Argentina, mas por Itália e Espanha. Há entre eles um jogador de futebol, um DJ, uma artista e também um padre.
Foi com dificuldade que o Vaticano conseguiu pôr o Papa Francisco em contacto com a irmã mais nova depois da eleição. “O telefone não parava de tocar. Depois Jorge ligou finalmente. Ele não conseguia falar a partir do Vaticano porque o meu telefone estava sempre ocupado“, explicou Maria Elena em várias entrevistas. A irmã continua a viver atualmente na Argentina, para onde os avós, imigrantes italianos, se mudaram em 1927.
Maria Elena, ou Mariela, para a família e amigos, tem vários problemas de saúde, razão pela qual nunca visitou o irmão 13 anos mais velho no Vaticano. Vive, segundo a imprensa italiana, ao cuidado de freiras numa instituição religiosa em Buenos Aires. O Papa costumava ligar-lhe todos os domingos.
Divorciada e mãe de dois filhos, Jorge e José, a irmã mais nova do Papa Francisco revelou por várias vezes que sempre manteve a proximidade com Francisco, que a apoiou nos momentos mais difíceis, como a separação e quando esteve doente. “Depois do AVC que me atingiu, ele ligou-me todos os dias até eu recuperar“, chegou a dizer ao La Reppublica.
O Papa também tinha proximidade com os seus filhos e era padrinho de batismo de um deles, Jorge, assim chamado em sua homenagem. Inspirou também José a fundar a Haciendo lío, uma organização que trabalha na área da justiça social.
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O Papa foi mantendo contacto também com outros familiares. “Falei com ele durante a semana. Disse-lhe: ‘Tenho um pé partido’. E ele respondeu: Menos mau que não tenhas partido a cabeça“, contou Carla Rabezzana, prima de Francisco sobre a última chamada com o pontífice. “Cuida-te”, foram as palavras que dirigiu ao primo nesse telefonema.
“É difícil falar. Tenho muitas boas recordações. É um vazio imenso”, admitiu a mulher, de 93 anos, citada pela agência Ansa. A prima, que tratava o Papa por ‘Giorgio’, vive em Portacomaro, na província de Asti, de onde, em 1929, a família Bergoglio partiu para a Argentina.
A mulher esteve pela última vez com o Papa em novembro de 2022, em Asti, a propósito do aniversário de Armando Bergoglio, cujo bisavô era irmão do bisavô do líder da Igreja Católica. Nella Bergoglio, também prima de Bergoglio, também tinha falado com o Papa recentemente. “Tive notícias suas há uma semana. Enviei-lhe uma mensagem a desejar a sua recuperação, aconselhei-o a cuidar-se. Agradeceu-me com um ‘muito obrigado, um abraço a todos, Nella, obrigada‘”, explicou, segundo a Vanity Fair Itália.
A mulher costumava visitar o pontífice duas vezes por ano, na primavera e antes do Natal, depois de ter descoberto que eram família. A descoberta foi feita, segundo relata a Vanity Fair, através de um padre, Don Capra, de Portacomaro, onde a prima viveu vários anos. “Quando nos conhecemos, ele pediu-me para aprofundar a nossa relação e rezar por ele“, afirmou, recordando como o viu pela última vez em janeiro deste ano, durante uma audiência no Vaticano com a Associazione Cuochi della Granda. “Ele cumprimentou-nos a todos, sorridente e sereno. Pediu que lhe trouxesse bagna cauda [um molho picante típico do Piemonte], se eu pudesse cozinhá-lo.”
Não só em Itália e na Argentina vivem os familiares de Francisco. Cristina Bergoglio, sobrinha de 58 anos, é pintora e artista plástica e fixou-se em Madrid. Já Felipe, o sobrinho-neto de 20 anos que nasceu em Córdoba, partilhava da sua paixão pelo futebol e é defesa no clube italiano Castiglione, sendo o irmão, Mateo, DJ em Barcelona. José Luis Narvaja, filho de uma das irmãs do Papa, foi o único que seguiu à sua semelhança a vocação sacerdotal. Com 59 anos, o padre, que como o Papa era jesuíta, é professor no Pontifício Instituto Bíblico, em Itália, e na Universidade Católica de Córdoba, na Argentina.