Pietro Parolin deu a cara aos acordos do Vaticano com a China e isso pode pesar (negativamente) na sua elegibilidade para Papa

Com início marcado para esta quarta-feira, o conclave deverá ficar marcado por pressões que têm origem em decisões e acordos assinados pelo Vaticano nos últimos anos. Um dos que mais pesa nas contas que vão ser feitas para escolher o novo Papa é a solução encontrada com a China nos últimos anos para estabilizar as relações do país com a Igreja Católica.

Há semanas que o cardeal italiano Pietro Parolin, secretário de Estado e braço direito do Papa Francisco durante uma década, surge nas casas de apostas como um dos favoritos para suceder ao seu antigo chefe. O seu passado, enquanto mediador e formalizador de um acordo secreto do Vaticano com a China, em 2018, é, no entanto, um argumento de peso para os que se opõem à sua escolha para novo chefe da Igreja Católica e pode colocar em causa a garantia de uma maioria de dois terços dos 133 votos que precisa para garantir o pontificado.

Vários cardeais, com voto no conclave, que se assumem como de tendência conservadora — sobretudo oriundos dos EUA e da Ásia — já manifestaram o seu ponto de desencontro com Parolin por ser a cara que representou o Vaticano no acordo com a China, que terá dado ao governo deste país alguma influência sobre quem serve como bispo católico. Muitos consideram mesmo que o acordo firmado é uma preocupante cedência ao Partido Comunista chinês, destaca o Financial Times.

Do outro lado da barricada, os apoiantes de Parolin dizem que a solução alcançada com a China foi melhor do que não haver qualquer diálogo entre a Igreja e o país, como acontecia há vastos anos. Há quem recorde que mesmo o Papa Bento XVI, conhecido por um pontificado mais conservador, apelava a uma solução, que foi finalmente alcançada com o seu sucessor.

O historiador Agostino Giovagnoli, citado pelo Financial Times, afirmou que Francisco, tal como os seus antecessores João Paulo II e Bento XVI, procurou uma aproximação a Pequim para sarar uma divisão de muitos anos.

“Houve uma continuidade entre esses três papas na abordagem em relação à China”, recordou Giovagnoli que diz que Parolin somente “cumpriu o seu dever e obedeceu à vontade deles”.

A vontade dos últimos três papas era a de aproximar o número estimado de 6 a 12 milhões de católicos na China ao Vaticano. Muitos deles foram forçados a passar à clandestinidade durante os anos sangrentos do regime maoísta e da Revolução Cultural, nas décadas de 60 e 70.

Quando a prática religiosa voltou a ser tolerada, nos anos 80, os católicos chineses estavam divididos entre igrejas “clandestinas”, leais ao Vaticano, e igrejas oficialmente reconhecidas pelo Estado Chinês, com bispos nomeados pela Associação Patriótica Católica do Estado.

“Os crentes católicos estavam em conflito; a comunidade estava dividida”, lembra Agostino Giovagnoli ao Financial Times, notando que agora “podem celebrar a missa juntos, não estão em conflito entre si e partilham os ritos”.

O acordo entre o Vaticano e o regime comunista de Pequim que possibilitou este entendimento foi assinado em 2018, e depois renovado sucessivamente por períodos de dois anos. Versa sobretudo sobre a questão da nomeação de bispos na China. Com a uniformização, o Papa passou a ficar com a última palavra na nomeação dos bispos desse país, mas de entre os indicados unilateralmente por Pequim, o que, em última análise poderá levar à escolha de candidatos que podem não cumprir os requisitos que o Vaticano colocaria à priori para os nomear.

“O procedimento previsto pelo acordo foi cuidadosamente estudado, levando em consideração as características particulares da história e da sociedade chinesa e os desenvolvimentos […] da Igreja na China”, afirmou o cardeal Pietro Parolin, em 2022, numa das renovações do acordo.

Apesar dos acordos firmados, a Santa Sé e a China não mantêm relações diplomáticas oficiais, uma vez que o Vaticano é um dos cerca de dez países que reconhecem Taiwan.

Author: Tudonoar

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